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Artigo extraído do livro Hayes, Robert Ames., Na??o Armada - A Mística Militar Brasileira; tradu??o de Delcy G. Doubrawa, Rio de Janeiro, BiBliEx, 1991.
A GUARDA NACIONAL
A cria??o da Guarda Nacional em 18 de agosto de 1831 revela a mentalidade de elite política brasileira com rela??o à tradi??o da na??o armada e ao exército regular. Jeanne Berrance de Castro assinala que, quando de sua cria??o, a Guarda era considerada como uma prote??o ao trono brasileiro, em oposi??o ao Exército "ainda identificado com D. Pedro 1" e "uma fonte de perturba??es e de insubordina??es". A Guarda era vista como uma incorpora??o da própria na??o. Assim, a Guarda foi criada ao mesmo tempo para se contrapor ao exército regular e para dar um novo segmento à tradi??o da na??o armada.
Havia também indícios da persistência de idéias do tempo colonial a respeito do antigo princípio de explora??o das vantagens institucionais, em um contexto militar, para o estabelecimento de um governo. Neste caso, "desde o come?o entendeu-se que a miss?o da Guarda Nacional era a institucionaliza??o de uma nova ordem legal". Fernando Uricoechea associa esta destina??o à debilidade do exército profissional "que n?o era capaz, em face da redu??o de seus efetivos, de ter uma a??o de presen?a no enorme território da jovem na??o". O problema que se apresentava era a dúvida clássica - n?o se sabia se a sociedade civil estava sendo militarizada ou se a organiza??o militar estava sendo apaisanada. Nas palavras de Uricoechea, "as diretrizes burocráticas contemporaneas militarizaram o estado, enquanto que o estado patrimonial brasileiro militarizou a sociedade civil". Dessa forma, a forma??o e o emprego da Guarda Nacional criam nova perspectiva para o acesso da elite política do processo de fortalecimento do estado, na época. Na prática, a Guarda era supervisionada por agências administrativas do governo central, mas continuava sendo uma corpora??o administrada patrimonialmente. Um tipo de paternalismo burocrático híbrido mas essencialmente instável acabou se desenvolvendo com base no pragmatismo. Este pragmatismo era caracterizado por decis?es administrativas orientadas mais pela experiência do que pela racionalidade técnica. Em síntese, a fórmula da coes?o sem consenso do período colonial parece ter sobrevivido.
No início, como a inspira??o para a organiza??o da Guarda era buscada em modelos estrangeiros, seus claros de oficiais eram preenchidos através de elei??o, mas esta prática se revelou prejudicial à determina??o dos proprietários rurais de controlá-la. As condi??es interioranas, que se originavam da predominante mentalidade familiar-patriarcal, levavam o povo a "pensar em termos de privilégios pessoais ou de classe, enquanto a no??o de obediência aos preceitos legais, em benefício do estado, tinham pouca significa??o". Em conseqüência, o preenchimento dos claros de oficiais passou a ser feito por indica??o.
O relacionamento entre a Guarda Nacional e o exército regular era semelhante ao da antiga milícia como o exército regular do período colonial, em muitos aspectos. Os aristocratas rurais que serviam na Guarda Nacional continuavam a gozar de foro militar ou seja uma espécie de prote??o legal oficial. Eles também podiam usar uniformes para participar de paradas ou tomar parte em cerim?nias religiosas ou seculares. Organizavam-se programas especiais para aumentar o prestígio da Guarda, sendo-lhe sempre dada precedência sobre o Exército em cerim?nias públicas. Ela também tinha prioridade no recebimento de recursos competindo com o Exército.
AS FOR?AS TERRESTRES BRASILEIRAS E A ESTABILIZA??O DO REGIME
Afinal, a necessidade de conter as tendências centrífugas, desencadeadas pelo Ato Adicional de 1834, que contribuíram para a ocorrência de numerosos movimentos revolucionários no período regencial, levou à aprova??o da Lei Interpretativa de 1840. Este dispositivo legal passou muitos dos poderes dos governos provinciais, centralizando-os em m?os do governo imperia1. A participa??o de militares na estabiliza??o do governo central, durante este período, merece algumas considera??es em face dos precedentes. José Honório Rodrigues descreve a situa??o da seguinte maneira:
A indisciplina estava t?o generalizada e as conspira??es eram t?o freqüentes que foi necessário dissolver o Exército, reduzindo a efetivos meramente simbólicos, e criar a Guarda Nacional, adestrada e comandada pelo Maj Luís Alves de Lima e Silva, futuro Duque de Caxias, que foi obrigado a contestar seu pai, o Regente Francisco Lima e Silva, e dedicar todos os seus esfor?os e apelar para os recursos disciplinares com 0 objetivo de obter a paz, de forma que através das páginas da história do Império o Exército fosse visto apenas como servidor da Constitui??o e da legalidade.
O papel messianico desempenhado por Caxias na manuten??o da integridade territorial e política brasileiras, salvando assim o país, merece um melhor exame. Foi Caxias quem reduziu drasticamente o Exército (Veja quadro 1), "um conglomerado de elementos heterogêneos e desirmanados" entre os quais "n?o era possível que o ideal de pátria pudesse florescer".